O Desenvolvimento Humano em Pessoas com Necessidades Especiais.
MEDRADO, Luciano.
Este artigo pretende problematizar o entendimento a respeito do desenvolvimento humano em pessoas com necessidades educacionais especiais tendo como pano de fundo para a ancoragem e sustento das afirmações e abordagens nele contidas os pressupostos da Psicologia histórico cultural e do materialismo histórico na visão Vigostykyana.
Toda teoria que se intitule materialista como a que estaremos abordando ao longo deste artigo, é pautada na consideração de que todas as coisas podem ser explicadas em termos de matéria. Do exposto é plausível e constatável que o homem é constituído de matéria, seja esta uma matéria de relações sociais, comunicativas laboriosas, produtivas, culturais etc. Sendo assim, segundo Engels (1972), a matéria é universal, existindo no tempo e no espaço. Para ele, esta matéria é também determinada de forma complexa pelas diversas relações estabelecidas no meio cultural em constante movimento, sendo este o depositário do caráter revolucionário das mais diversas ações e atividades humanas.
Enquanto ciência, a dialética concebe toda história natural e humana como estando em um contínuo estado dinâmico de modificação/transformação num vir a ser constante, seja pelas mãos humanas ou por forças e acontecimentos naturais. O pensamento dialético se sustenta na explicação dos acontecimentos humanos a partir de suas contradições. Sendo assim em qualquer fenômeno existem tendências contraditórias e antagônicas que se intercomunicam mutuamente e não se excluem.
Interferindo no conjunto das relações sociais da qual faz parte, o homem, não apenas se transforma quando modifica a natureza. É dessa assertiva que Vygotsky constrói sua teoria Psicológica histórico cultural, apresentando a importância assumida pela sociedade e cultura na formação e transformação do homem, partindo da gênese da dialética do movimento entre o social e o natural.
Para que o homem enquanto um ser de totalidade e de relações possa se humanizar faz-se necessário que ele se aproprie das conquistas concebidas pelos seus antepassados. Do exposto, não é a herança biológica o principal determinante na constituição do ser humano uma vez que a ausência de alguns de seus componentes como ocorre em pessoas com algum tipo de deficiência não implica em dificuldade no que tange as relações sociais.
Por isso, para Vygotsky (1987) o ambiente no qual vivemos se configura como fator crucial para o desenvolvimento e evolução do gênero humano. É dele a afirmação: “o home só é home em relação a outros” (1993). Devido a preponderância do fator sócio cultural, os homens não possuem uma identidade fixa, pré determinada e acabada uma vez que a nossa arquitetura ontológica consiste no fato de formarmo-nos a partir da apropriação do que foi historicamente acumulado pela humanidade.
Devido a esta característica Vygotsky (1995) afirma que o ser humano em consonância ao seu princípio de desenvolvimento, se aperfeiçoa devido a u complexos de conceitos como o desenvolvimento natural que é possibilitado pela maturação biológica e pelo desenvolvimento artificial, garantido pelos processos educativos aos quais participamos onde desenvolvemos nossas potencialidades e talentos.
Para Vygotsky (1995) o desenvolvimento humano se dá por meio de duas linhas a saber: a linha biológica e a linha histórica. Para ele todo o desenvolvimento maturacional do ser humano resulta da união dialética e contraditória que se expressam em relações de complementaridade. Se desenvolvendo por meio destas duas linhas Vygotsky tece suas considerações sobre a deficiência classificando-as em primária (déficit intelectual, disfunções parietais, físicas, cromossômicas), ocasionadas pela má formação ou disfunção de algum caráter biológico ou hereditário e, em secundária (o não enraizamento ao contexto externo), sendo esta derivada do isolamento das relações sociais e culturais que se limitam os seres humanos.
Se o social se sobrepõem sobre o biológico, percebemos que Vygotsky confere grandes potencialidades aos indivíduos com necessidades especiais, desde que as condições materiais lhes ofereçam as possibilidades de se apropriarem do patrimônio histórico cultural elaborado. É deste pressuposto que Vygotsky (1995) explica analiticamente a deficiência em termos positivos, pois além de não ficar preso em seus limites/impossibilidades, destaca as inúmeras potencialidades que podem surgir mediante a criação de um ambiente rico e acolhedor. Coerentemente, uma criança com alguma lesão orgânica não é menos desenvolvida do que outra criança tida por normal, mas, sim, uma criança que se desenvolve diferentemente, sob outros olhares, desafios e perspectivas.
Para Vygotsky (1995, p. 32):
A educação das crianças com diferentes defeitos deve basear-se no fato de que simultaneamente com o defeito estão dadas também as tendências psicológicas de uma direção oposta; estão dadas as possibilidades de compensação para vencer o defeito e de que precisamente essas possibilidades se apresentam em primeiro plano no desenvolvimento de crianças e devem ser incluídas no processo educativo como sua força motriz.
Fazendo uso de suas palavras, Vygotsky (1995), reitera a afirmação do parágrafo acima: “onde é impossível o desenvolvimento orgânico, ali está aberta de forma ilimitada a via do desenvolvimento cultural”.
Por fim, finalizo este artigo mais uma vez com as palavras de Vygotsky (1995, p. 45):
“É um equívoco ver na anormalidade só uma enfermidade. Na criança anormal nós só vemos o defeito e por isso nossa teoria sobre a criança, o tratamento dado a ela, se limitam a constatação de uma porcentagem de cegueira, surdez ou alterações do paladar. Nos detemos nos gramas de enfermidade e não notamos os quilos de saúde. Notamos os defeitos e não percebemos as esferas colossais enriquecidas pela vida que possuem as crianças que apresentam anormalidades”.
Referências
LURIA, A, R. Pensamento e linguagem: as últimas conferências de LURIA. Diana Myrian Lichtenstein (Trad.). Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.
VIGOTSKY, L. S. Historia del desarrollo de las Funciones Psíquicas Superiores. Ed. Científico Técnica, Ciudad de la Habana, Cuba, 1987.
VYGOTSKI, L,S. Obras escogidas. Jose Maria Bravo (Trad.). Madrid: Aprendizaje Visor, 1991. v.1.
VYGOTSKI, L,S. Obras escogidas. Jose Maria Bravo (Trad.). Madrid: Aprendizaje Visor, 1993. v.2.
VIGOTSKY, L. S. Fundamentos de Defectología, Obras Completas, Tomo V, Ed. Pueblo y Educación, Ciudad de la Habana, Cuba, 1995.
PICCOLO, Gustavo Martins. Da deficiência a eficiência: o portador de necessidades especiais visto sob a luz da Psicologia Histórico Cultural. Artigo disponível em: http://www.efdeportes.com/efd130/portador-de-necessidades-especiais-visto-sob-a-luz-da-psicologia-historico-cultural.htm. Acesso em: 09 de abril de 2011.
Luciano Medrado (Pedagogo e Esp. em Educação Especial)
sábado, 9 de abril de 2011
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